POR SEANE MELO

Sex with me, so amazing

Eu não podia acreditar no que tava acontecendo. E nem segurar o sorriso a cada nova mensagem que chegava. Eu tava na minha, me acostumando aos dias de tédio, quando pipocou uma mensagem dele no meu Facebook. Devia fazer uma década que a gente se esbarrava nos rolês. Dessas coisas que acontecem quando se mora […]

Eu não podia acreditar no que tava acontecendo. E nem segurar o sorriso a cada nova mensagem que chegava.

Eu tava na minha, me acostumando aos dias de tédio, quando pipocou uma mensagem dele no meu Facebook. Devia fazer uma década que a gente se esbarrava nos rolês. Dessas coisas que acontecem quando se mora em cidade pequena e se é classe média num estado fodido. Mas nunca rolava muita interação. A gente tinha se falado por uns cinco minutos apenas uma vez, e eu ou ele, não lembro, tinha aproveitado a deixa pra já enviar convites de amizades nas redes sociais. Só que nada tinha acontecido até aquele dia.

Ele veio puxar assunto sobre um dos meus textos e eu, ainda que receosa (putz, o quê será que ele acha disso?), agarrei a oportunidade pra engrenar uma conversa longa.

O papo tava fluindo bem e eu conseguia adivinhar, do outro lado da tela, ele calculando cada palavra para chegar aonde queria. Ele queria falar putaria. Confesso que, mais do que falar, o que eu queria era ter data, hora e lugar agendados com ele pros próximos dias. Mas eu aceitei entrar na onda de boa vontade e tava vibrando de excitação até ele mandar essa:

“Quando a gente se encontrar, eu quero que você dance pra mim”.

Deu merda!

“Eu vou estar deitado e quero você nua dançando em cima de mim”.

Ferrou.

Passei uns cinco minutos criando imagens mentais e avaliando todos os cenários possíveis. Por um lado, eu achava bacana ele querer me ver de baixo pra cima. Esse deve ser bundista como o Zanatto, calculei. E daí pra sentar na cara, é um pulo. Hmm, isso eu poderia fazer. Mas, quando eu começava a me animar com a perspectiva, a primeira frase voltava à minha cabeça.

“Quando a gente se encontrar, eu quero que você d-a-n-c-e pra mim”.

Não é nem que eu dance tão mal assim. Também não sou boa. Mas o que pegava mesmo era todo o conceito de dançar pra alguém antes do sexo. (Ou será que ele imaginou durante?). De dançar avisado, ensaiado e com o propósito de realmente seduzir alguém. Isso ia contra toda a minha filosofia de sentir que putaria cada momento pede, entende?

Me peguei logo cogitando se isso não tinha a ver com as coisas que eu escrevia. Sei lá, minhas amigas vivem me perguntando se os caras não me abordam por conta dos textos. Pra ser sincera, o que me incomoda não é ser ou não abordada. E, sim, essa pulga atrás da orelha das expectativas que criam em cima de mim. Outro dia, um amigo de longa data me encontrou por acaso e soltou que nunca tinha me imaginado daquele jeito. Mentalmente, eu disse “graças a deus que cê não perde o seu tempo me imaginando fudendo, né querido?”.

“Migo, não viaja. Eu escrevo ficção”, foi o que eu disse na hora.

“Mas, pra escrever, tem que entender”, ele não quis dar o braço a torcer.

Entender, não fazer, pensei.

A música tocando no celular é No Police, da Doja Cat. Olho ele, de cueca, deitado na cama. Tiro a calça jeans e vou engatinhando até ficarmos cara a cara. Começo a rebolar um pouco naquela posição, sento de joelhos e tiro a camiseta. Fico em pé na cama. Ensaio movimentos lentos com o quadril e, eventualmente, passeio com o pé por cima dele. Tiro a calcinha e volto a rebolar, me posicionando exatamente acima de sua cabeça. Vou descendo e paro a alguns centímetros de distância do rosto dele para dar um suspense. Fico de quatro, agora com a bunda na direção do seu rosto. E bato o cabelo como a Britney Spears no macacão transparente de swarovski em Toxic.

Pra funcionar, você tem que imaginar a cena exatamente como se fosse uma coreografia da Britney. Porque eu mesma nunca faria isso sem me sentir na pele de outra pessoa. E, se algum dia eu topasse fazer algo do tipo, a música tocando seria da Nicki Minaj…

“É essa música que você quer escutar agora?”, ele reclamaria.

“Cala a boca. A performance é minha”, eu diria, deixando o celular no criado mudo, e me virando para encará-lo.

Eu me aproximaria fazendo caras sensuais exageradas e cantarolando o refrão “I’m feeling myself, I’m feeling myself”. Pressionaria meu quadril na perna dele e bagunçaria seu cabelo ainda fazendo caras e bocas. Viraria de costas e improvisaria um twerk mal executado no pau dele, fazendo uma bela demonstração de toda a minha falta de flexibilidade. (Tenho que parar de pular os alongamentos). Ele me seguraria pelo quadril e perguntaria sorrindo:

“Beleza, agora a gente já pode transar?”

“Nossa, que grosso! Tava te seduzindo”, eu me faria de ofendida.

“Ué, mas já deu, tô de pau duro”.

“Cê sempre tá de pau duro”, eu faria pouco caso.

“Ah é?”, ele perguntaria lisonjeado.

Eu confirmaria com a cabeça e enfiaria minha mão na cueca dele.

“Sempre acontece quando cê tá por perto”, ele sussurraria.


Acho que se eu explicasse que amo literatura erótica e que tenho como desafio desenvolver uma narrativa atual, pouco convencional e _principalmente_ baseada em um olhar completamente feminino do sexo, esse projeto perderia um pouco da graça, né? De toda forma, se você curtiu esse texto (tem outros antes desse!), ficaria honrada demais em receber recomendações e comentários. Acho que também toparia receber uns convites para publicações, uns depósitos inesperados na minha conta bancária ou suprimento vitalício de tapioca.

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