POR SEANE MELO

Cool for the Summer (II)

[Não leu a primeira parte? Volta aqui] La Belle Saison (2015). Não sei quem começou. Eu e Luísa nos beijamos por uns 20 minutos no sofá. Tô falando um tempo aproximado, porque é óbvio que não contei no relógio. O som de vozes e risadas que vinha da varanda não mudou, ninguém nem reparou. Só sei […]

[Não leu a primeira parte? Volta aqui]

La Belle Saison (2015).

Não sei quem começou. Eu e Luísa nos beijamos por uns 20 minutos no sofá. Tô falando um tempo aproximado, porque é óbvio que não contei no relógio. O som de vozes e risadas que vinha da varanda não mudou, ninguém nem reparou. Só sei que, em um momento, ela parou de me beijar porque eu não consegui segurar o riso.

“Que foi?”

“Lembrei da música da Demi Lovato que dizem que é lésbica”

“Por que cê tá pensando nisso?”. Luísa era foda, ela sempre falava umas coisas que me deixavam besta sobre uns assuntos interessantes de verdade, acho que perguntou isso mais por educação.

“Porque cê num tem gosto de cereja”, disse e fiquei rindo sozinha, enquanto ela revirava os olhos. Não disse que tinha gosto de álcool.

“Luísa, cê sabe que eu vou dormir aqui, né?”

“Sei…”

“A gente vai se ver pelada?”, quis me preparar.

“Ah, vamo… — Mas, não repara, tô meio que com uma barriguinha saliente…”, ela disse passando a mão no pequeno volume que a barriga fazia no vestido preto. Luísa tinha dessas de não se sentir bonita, não sei como ela conseguia, no duro.

“Tua cara”.

Ela voltou a me beijar e, enquanto a beijava, pensava que talvez fosse mesmo tranquilo transar com uma amiga. Foi se chegando em mim, esfregando seu corpo no meu e, até aí, tudo era muito familiar. Segurei Luísa pelos cabelos e a beijei com mais intensidade incentivando-a a continuar. Na minha cabeça, me sentia a mais ativa de todos os tempos e isso me excitou um bocado. No fundo, sexo é mesmo um jogo de poder, né? Até ali, meu único movimento, nesse jogo, era ceder, mas, a Luísa que me desculpasse, eu tava a fim de fazer as pazes com a Vênus das peles, dar as ordens e tudo.

Ela se afastou por um momento e disse que precisava de um pouco de água gelada. Afundei no sofá e a assisti se levantar, desviar da mesinha de centro super careta que a mãe dela tinha insistido em dar de presente (e que, infelizmente, combinava com a mesa de jantar atrás da gente), e caminhar em direção à cozinha. Tava tão perdida que vi todo o percurso em câmera lenta. Ela parou na porta da sala e sorriu pra mim. Tenho fraco por sorrisos bonitos e achava o dela incrível. Ela tinha os dentes meio compridos e não tão largos, mas acho que o charme era a moldura que os lábios formavam, lembrava a Emma Stone. Fiquei distraída com isso até perceber que ela me recriminava com os olhos. Que lerda, era preu ir atrás! Levantei do sofá, quase tropeçando no tapete, e a acompanhei até a cozinha.

Luísa era mais baixa que eu, mas me imprensou contra o balcão da pia, que ocupava quase toda a parede da cozinha minúscula, e voltou a me beijar. Fiz essa pequena concessão no meu plano de dominar a situação porque achei a cena toda linda. Ô, Luísa, cê beija mó bem! Mentalmente, comemorava o fato de já estar bem molhada, quando ela, sem me dar pistas do próximo movimento, se aproximou ainda mais e encaixou a buceta na minha coxa direita. Arregalei os olhos de susto e senti um certo desespero me invadir. Parte do meu cérebro se concentrava em continuar beijando pra não entregar minha aflição, enquanto a outra parte tentava me impedir de entrar em pânico. Nessa hora, lembrei do tweet da Roberta Miranda que eu sempre reproduzia quando me sentia atordoada. Não sei o que dizer… só sentir… Eu não sabia o que pensar mesmo, mas o pior de tudo é que eu não sabia lidar com o que sentia. Pra completar, meu cérebro achou que era a hora apropriada para tocar uma sirene de NÃO TEM VOLUME, NÃO TEM VOLUME, que por muito pouco não me fez afastar Luísa abruptamente. Tentei mudar de posição discretamente para reduzir o contato (Ai, cacete, não tô acostumada a sentir esse ossinho), não sei se deu para perceber, mas ela acabou se afastando.

“Acho que bateu o cansaço, Luísa”, soltei assim que nos separamos e bocejei.

“Já quer dormir?”

“Tô achando que não aguento mais muito”, mandei aquela cara de tristeza que reservo pras vezes que me param em blitz.

“Hum… Acho que tenho que esperar o pessoal ir embora, mas pode ir pro meu quarto, se quiser”, ela disse meio desconcertada.

“Opa, acho que eu vou mesmo. Tô cansada de verdade”.

Dei um último selinho nela e um abraço, antes de sair andando pelo corredor.

Fui pra cama morta de aliviada por Luísa não poder me acompanhar. Não saberia o que falar e não queria que ela pensasse, sei lá, que eu tinha ficado com nojo. Mas eu não parava de pensar na falta de volume. Falta! Que bosta, lembrei-me de um amigo explicando que a falta era um argumento comum contra o relacionamento homossexual. Eu não sou assim. Acho que só não me preparei direitinho ou talvez seja estranho fazer isso com uma amiga mesmo, no fim das contas. Na real, eu achava a Luísa foda e lembro até que fiquei com ciúmes quando ela saiu com uma mina pela primeira vez, mas nunca a vi com interesse sexual. Só não sabia se isso era por estar acostumada a botar mulheres na gaveta da amizade ou se não tinha tesão ali e eu forcei a minha própria barra. Ainda não tô preparada, tentei me consolar e abreviar a crise pra dormir antes dela voltar.

Peguei o celular e tinha notificação de mensagem do Jefferson. Não abri. Fitei o teto e me recriminei enquanto alguns pensamentos iam se encaixando melhor. O foda é que quando boto na cabeça que quero comer bolo, a fome só passa com bolo.


“Um dia vou reunir todos os contos eróticos em uma publicação do medium para facilitar a vida dos leitores”, disse a autora deste conto antes de constatar que estava com muitos trabalhos atrasados.

Mas, antes que organização se realize, talvez você esteja interessado em saber: 1) Esses contos fazem parte de uma só história? Sim. A personagem principal apareceu pela primeira vez no texto Talvez eu não seja voyeur. A ideia, com ela, era desenvolver uma narrativa atual (por isso muito coloquial), que se passasse em São Luís (Chega de Rio e São Paulo!) e que tentasse apresentar uma mulher distante do imaginário da femme fatale. 2) É uma história autobiográfica? Não. A personagem tem um nome. E um nome diferente do meu. Estou quase certa de que o nome dela é Rita. Vou perguntar de novo quando encontrá-la. Sou péssima com nomes.

De toda forma, se você gostou desse texto, minha mãe me prometeu um bolo de nata para cada 50 recommends que eu ganho por aqui. Minha dieta está em suas mãos!

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