era, sim, uma ótima ideia ter um sugador de clitóris me acompanhando em minha jornada pandêmica
Enfrentei meu medo, digitei o endereço da loja online, decidida, fui na seção específica, encontrei o que procurava e cliquei. Hesitei um pouco, mas depois de conferir pela décima vez que não haveria nenhum problema para carregar e que não tinha deixado passar nenhum detalhe, apertei o botão comprar.
Fiz meu cadastro o mais rápido que pude para não desistir, só me demorei um pouco mais no endereço, porque não poderia haver nenhum, absolutamente nenhum, erro. Quando recebi o e-mail de confirmação de compra, me demorei encarando a parede do quarto, que também me servia de escritório desde o início da quarentena, e repetindo o mantra de que era, sim, uma ótima ideia ter um sugador de clitóris me acompanhando em minha jornada pandêmica.
Não era a única que repetia esse movimento. Pelo menos três amigas me contaram de suas compras. Dildos, cintaralhos e vibradores eram os itens mais adquiridos entre as mulheres do meu círculo social. E muitas delas, assim como eu, estavam desbravando o universo dos sex toys pela primeira vez.
Para ser sincera, ainda me sentia iniciante, mas tinha comprado meu primeiro brinquedinho há dois anos. Tinha começado bem leve, com uma magic wand, um massageador que conseguia me fazer gozar em poucos minutos e que também já tinha me rendido bons momentos a dois. O sugador prometia a mesma eficiência com alguns requintes. Além de vibrar de diferentes modos e com intensidades ajustáveis, ele tinha esse diferencial de sugar — sabe-se lá o que queriam dizer com isso! — que me fazia pensar “deus me livre, quem me dera” com mais frequência do que gostaria.
Quando ele chegou, numa caixa preta com letras douradas bonita e com um design belíssimo, jurei que havia sido a melhor escolha. Apesar do nome assustador — sugador de clitóris não pegaria bem nem em bio do Tinder — aquele objeto pequeno e bonito era a minha aposta para os meses que viriam, eu trancada com a família em um apartamento de paredes muito finas.
Ter privacidade na residência dos meus pais era uma utopia. Uma porta fechada sempre gerou estranhamento e curiosidade. E, mesmo com 30 anos, ainda me via dando explicações toda vez que precisava me fechar em meu próprio quarto. Caso esquecesse de explicar, corria o risco de alguém abrir a porta para me perguntar algo ou simplesmente para inspecionar minhas gavetas em busca de alguma coisa que não tinha a menor chance de ter ido parar ali. O meu ambiente familiar era basicamente o pesadelo do tesão, mas eu pensava que, talvez, com uma ajudinha do sugador, poderia gozar plenamente, em poucos segundos, antes de dormir.
Em nossa primeira noite juntos, planejei todos os detalhes. Em primeiro lugar, esperar que todos dormissem parecia sensato. Por mais que isso me obrigasse a perder algumas horas de sono, valeria a pena simplesmente para evitar a entrada súbita de alguém no meu momento de intimidade. Mas isso também gerava um outro problema: o barulho. As paredes finíssimas pareciam ainda mais sensíveis no silêncio noturno. Por isso, além de me certificar de ser extra silenciosa, concluí que seria bom providenciar um outro ruído de disfarce.
Como tentava estudar chinês antes de dormir, achei que uma videoaula qualquer do YouTube seria o som mais neutro que poderia acrescentar para a calmaria da noite em nossa casa. Apesar de soar um pouco constrangedor e broxante, era um backup necessário caso algum gemido incontrolável escapasse.
O último detalhe era a bendita porta! Que não tinha chave e estava sempre aberta. De certa forma, a culpa era minha. Nos últimos meses tinha percebido que o quarto ficava muito mais refrescante durante a noite quando ela estava aberta, e, além disso, garantia melhorias consideráveis para a minha rinite. Sentia que precisava de uma boa desculpa para fechá-la sem levantar suspeitas.
A desculpa perfeita surgiu quando Sirius entrou no quarto e começou a arranhar meus lençóis. O gato preto da casa vivia atrapalhando o nosso sono e ultimamente estava dando preferência a minha cama. Ensaiei uma discussão falsa com ele, ameaçando fechar a porta para que ele não interrompesse meu descanso. E, finalmente, me vi sozinha em um espaço protegido.
Desliguei a luz, dei play na videoaula em um volume que não me atrapalhasse tanto, tirei minha roupa — ainda que não fosse necessário tirá-la completamente, julguei que era uma ocasião especial — e deitei na cama com o pequeno sugador ao meu lado. Senti o toque do silicone nas mãos e, muito hesitante, apertei um botão. Nada aconteceu. Apertei novamente, nada. Tentei segurar por alguns segundos, não funcionou. Peguei o celular para me ajudar com a iluminação, encarei os três botões disponíveis, tentei mais uma vez apertar o mesmo botão, que parecia a única opção correta, e novamente nada aconteceu.
Quando já pensava em carregar novamente, o dedo escorregou em outro botão e finalmente o pequeno aparelhinho começou a funcionar. OK, agora vai, respirei fundo antes de criar coragem para aproximá-lo da minha buceta. Quando quase o encostava, lembrei que não sabia muito bem como seria a tal da sugada e decidi experimentar na mão antes. Por alguns instantes não senti nada além da vibração, mas quando o aproximei um pouco mais da pele senti uma leve pressão que lembrava realmente uma sugada. Aliviada e preparada para acionar o botão que reduzia a intensidade caso fossem sensações demais, finalmente fui em frente.
O bom de vibradores eficientes como a magic wand e o sugador de clitóris é que mesmo em condições adversas, como ouvindo a voz de um professor chinês repetindo algumas expressões básicas de saudação ou tentando esquecer que seus pais dormem ao lado, você vai gozar e, principalmente, vai gozar sem esforço. E, na maior parte das vezes, lubrificante é dispensável. Ou seja, não suja quase nada.
Com o sugador, sobretudo, experimentei um gozo cirúrgico. E lembrei da moça da TV falando que eram apenas segundos para gozar. Poucos segundos. Quando você lê esse tipo de coisa na descrição de um produto, parece realmente uma vantagem. Quando você tem medo que alguém entre no seu quarto do nada, também. Mas assim que comecei a experimentar o prazer da vibração e da sugada de mentirinha, logo que fechei os olhos e senti o músculo de uma das pernas dar uma leve puxadinha — como acontecia quando estava realmente gostoso –, tudo que quis era que aquela sensação durasse muito mais.
Não deu tempo de decidir entre mentalizar o Hyun Bin de terno completo ou com sobretudo e gola rolê. Muito menos de criar nossa cena. Ele esbarraria comigo num cafeteria e me ofereceria um iced americano? Ou preparia um rámen para nosso jantar?, essas questões urgentes não encontrariam respostas num intervalo tão curto.
Repeti o ritual por algumas semanas. Toda noite me prometia afastar o sugador antes de chegar lá, mas logo percebi que tínhamos um problema de timing irreversível. Lembrei de um boy que uma vez me perguntou por que eu ainda saía com homens, já que tinha a magic wand ao meu dispôr.
– Bom, não saio com homens para gozar — respondi.
Ele se fez de ofendido, enquanto eu dava de ombros. Não era uma crítica.
Depois de falhar em demorar um pouco mais com o sugador, até comecei a sentir saudade dos homens que não me faziam gozar. Percebi que, para mim, havia algo de muito prazeroso em movimentar o corpo naquela dança a dois, de estar consciente do suor escorrendo e quase experimentar fisicamente o prolongar do tempo. Talvez eu não precisasse tanto de vibração, mas desejasse também o estático, o vagar e o esforço.
Foi assim que comprei um plug anal.
Este conto foi originalmente publicado na Lábios Livres, onde publico mensalmente histórias inéditas. Você pode conferir em primeira mão por lá ou me acompanhar por aqui!
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