POR SEANE MELO

Mais um texto sobre mim em que vou citar o BTS aleatoriamente

Ainda em abril deste ano, falei sobre meus sonhos e os desafios que enfrentava tentando realizá-los com a desculpa de falar sobre como os membros do BTS passaram seis anos sem tirar férias.

Ainda em abril deste ano, falei sobre meus sonhos e os desafios que enfrentava tentando realizá-los com a desculpa de falar sobre como os membros do BTS passaram seis anos sem tirar férias. E, durante muitos meses, eu amarguei o fato de ter escrito esse texto, racionalizando minha obsessão e dando uma utilidade para o que eles representavam para mim.

A verdade é que, ainda agora, passo por essa recente obsessão apenas pelas bordas. Digo para mim mesma que tenho vontade de entender que lugar esses artistas ocupam na minha vida hoje, mas logo em seguida dou play em um vídeo para afastar essa questão rapidamente, como um inseto indesejável.

Por mais que tenha repetido o movimento de me aproximar e fugir inúmeras vezes — como quem brinca de tocar as campainhas da vizinhança e se esconder — minhas fugas nunca foram completamente eficientes. E, entre um passo e outro, me dei conta de uma coisa. Eu não saberia dizer porque tinha me tornado fã ou, ao contrário, poderia elencar tantos porquês que os tornaria inválidos. Não saberia ainda expressar e enfrentar a questão sobre que lugar eles ocupam na minha vida, mas conseguiria dizer qual era o sentimento que me mobilizava nessa relação.

Tentei procurar uma forma menos constrangedora de escrever isso — e é engraçado que alguém que escreva histórias eróticas se sinta constrangida dessa forma — mas não encontrei nada que substituísse essa confissão direta. O que sinto pelo BTS é paixão.

— Ah, paixão, como quando você diz “o flamengo é a minha paixão”, “cinema é a minha paixão”, esse tipo de paixão, né?

Se eu precisasse descrever esse sentimento, eu diria que é equivalente a sorrir para o celular ao receber “bom dia” de uma pessoa que você queria pegar, a sentir o coração disparar com a chegada de uma resposta que demorou quase 30 minutos. Mais como receber um sticker com uma cantadinha de alguém que você desejava, mas não esperava naquela manhã. Ou como encontrar alguém com quem é tão absurdamente fácil conversar. Tipo ver a notificação de que a pessoa interessante que estava na casa da sua amiga te seguiu no Instagram e curtiu três fotos. Quase como pensar “meu deus, era muito pra ser, quando eu encontraria alguém que caiu de paraquedas na Coréia do Norte?” — Ok, essa é uma piada.

Estar apaixonada pelo BTS é aquele flutuar leve, aquela vontade de ser um pouquinho melhor, de saber o que vai acontecer no dia — e algo sempre acontece no dia. No fundo, é o que eu já sabia, um colorido que preenche o que estava vazio há tanto tempo. (E ainda está).

Assim que aceitei o sentimento, o que mais me fascinou na ideia de estar apaixonada por uma banda foi o meu trabalho de criação. Tentei dizer, em voz alta, que era um amor em que só eles eram amados, em que só eu depositava, mas percebi imediatamente que era o contrário. Era tudo, tudo, absolutamente meu. E como é tentador permanecer nesse lugar!

Até que veio esse texto. Essa vontade de enunciar que talvez eu não saiba e não queira viver sem uma paixão. Mas que não posso permanecer desta forma, a salvo do mundo, pois não há nada mais importante que se sentir afetado por outros seres vivos — é o que tenho pensado a cada dia que passa dessa pandemia.

Em uma de suas falas na Tour Love Yourself, Kim Namjoon (RM) diz que ainda está descobrindo sobre o amor próprio, que não sabia nada sobre se amar, mas as fãs o ensinaram a fazer isso, a partir dos seus olhos, cartas, tweets e de todas as demonstrações de carinho. A parte mais bonita, para mim, é quando ele confessa “It feels like I am using you guys to love myself” e propõe “So I wanna say one thing. Please use me. Please use BTS to love yourself”.

Acho que pode parecer apenas uma frase de efeito, mas o que me afetou quando vi esse vídeo foi o fato de que, há sete meses, tudo que faço é usá-los. E é fascinante para mim que eles tenham consciência disso. De que agora mesmo, eles estão sendo construídos e narrados em cabecinhas de milhares de pessoas no mundo. E de como eles se mostram abertos para isso, como acolhem — quiça essa seja a sinceridade do BTS da qual tanto se fala no fandom.

Talvez Namjoon esteja certo e seja possível mesmo usá-los para nos amar. Usá-los para descobrir um monte de camadas esquecidas. Vontades que eu nem tinha mais coragem de enunciar. Deitar ao lado de um corpo quente, enfiar o nariz em um mar de cabelos, sentir o cheiro que não é o shampoo e não é a pele, mas que nunca consigo descrever. Ou coragens que pareciam pertencer ao passado, como querer conhecer o novo, experimentar gostos desconhecidos, dar espaço para os estranhamentos.

https://twitter.com/i/status/1066089081870835712

Enquanto pensava nesse desabafo, em como concluir algo que não está concluído na minha cabeça, uma mesma imagem surgia na minha cabeça. Até agora ela se repete. Vejo uma mulher, acredito que seja eu, com os pés na parede e as pernas esticadas no chão tentando levar as mãos até os pés. É um exercício simples de alongamento para chegar a um lugar que ainda não alcanço. Mas a parede está ali para isso, para que eu possa colocar as mãos num ponto mais alto ou onde der, onde seja mais fácil tocar, até, algum dia, conseguir tocar meus próprios pés.

Ainda me alongo no pensamento de que um dia precisarei me apaixonar por mim e pelo que posso criar.

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