
Uma vez tive rolo com um cara que morava em outro estado. Foi dessas coisas de conhecer a pessoa pela internet, começar a conversar, conversar por mais um mês e daí já iniciar uma contagem regressiva pelos três meses que ainda faltavam até a gente descobrir se encaixava gostoso. Encaixava, pois, na verdade, essa é a história do início de um dos meus namoros. Mas só tô lembrando dela agora, porque sempre serve de parâmetro quando me meto nessas furadas.
Foram três meses de conversa diária e, hoje, pensando em como acabou, até me surpreendo pensando no que raios eu e ele poderíamos ter pra conversar. Lembrar do que a gente falava é difícil mesmo, mas, do que a gente não falava, é bem fácil. Na época, achava engraçado, pra falar o mínimo, que a gente gastasse tanto tempo conversando online e, nem por um minuto, o papo acabasse em putaria, sabe? Ele era um cara que falava abertamente de várias coisas, inclusive das meninas com quem trepava, e eu nunca soube ser discreta, mas sempre que tava chegando em algum assunto que pudesse deixar alguma pista do que a gente gostava na transa, ele pedia pra parar. Eu lembro que achava graça e tinha um pouco de medo também. É óbvio que ele tem o pau pequeno, pensava. Quem já conheceu um cara “pauzudo” sabe: não é preciso nem terminar de digitar o manda nudes pro celular indicar o download de uma foto. Esses caras têm simplesmente muito orgulho do pau pra perder tempo com suspense, né? No caso dele, dizia que não era isso, era mais pra preservar as surpresas e evitar fantasiar coisas de um jeito que poderia não se concretizar. Eu não sabia se dava pra controlar expectativas, mas também tinha o medo de revelar algo que gostasse e acabar influenciando no jeito dele de me comer. Gosto quando a mágica acontece por acaso, sabe?
A primeira vez que essa experiência me serviu de parâmetro foi quando entrei no Tinder. Conheci dois caras. Tenho um pouco de vergonha de dizer isso, mas sou do tipo que entra lá pra conversar. Então, um virou só meu amigo. Conversamos por meses, nunca marcamos nada, depois ele casou, teve filho e me manda um meme natalino do filho todo ano. O outro foi o que escolhi pra tirar o atraso e, olha, o sujeito era bem mais que “o que tem pra hoje”. Pela bio, eu tinha encontrado aquela calça 38 perfeita, que não fica folgada na cintura, não aperta demais as coxas e dá uma levantada de cortesia na bunda. E tava tão certa de que o cara era tudo que tava procurando, que não me preocupei com essas coisas de expectativa. Expectativa o quê? Era real: revi mil vezes a foto e tive certeza de que o papel que ele segurava era um panfleto pra reeleição da Dilma. Sabia até que tinha escrito “coração valente” no adesivo colado à sua camisa. Pronto, só precisei daquilo. Fui conversar com o cara dando mole demais. Bebi umas cervejas com minhas amigas e já deixei um aviso de que tava tarada. Ele achou graça, também tava, sempre tô aliás, me disse. Nunca tive muito jeito pra dirty talk, tipo isso de “tô vestindo uma camisola transparente azul bebê jujuba de maçã verde”. Mas a gente começou bem.
“Eu gosto muito de transar, sabe? Uma vez fiz uma viagem com uma garota com quem saía e perdemos todos os passeios turísticos porque transamos sem parar”.
Eu, já deitada na cama, mordia o lábio e fechava os olhos de empolgação imaginando aquele cara me comendo de ladinho em uma manhã preguiçosa. Disse isso pra ele. “Agora foi você quem me deixou de pau duro”, respondeu.
A conversa seguiu até eu ter que levantar da cama duas vezes para fazer xixi e tentar dar um jeito em toda aquela lubrificação. Marcamos a foda pro outro dia.
Não preciso dizer que não foi essas maravilhas, né? No papel, quer dizer, no back up daquela conversa, tava ali mais do que comprovado que nós curtíamos as mesmas coisas. Só que, em cima daquela cama de solteiro, mesmo enquanto o beijava, só conseguia pensar que nada daquilo me surpreendia. A foda ficou tão certa, mas tão certa, mas tão certa, que a gente deve ter perdido alguma coisa essencial da incerteza. Nessas horas a gente até fica tentada a achar que um dos grandes motores da foda é aquela incerteza de se o cara vai tentar enfiar um dedo no nosso cu de surpresa. Pelo menos aprendi uma lição, era o que eu pensava até bem recentemente.
O Marcelo puxou assunto por mensagem privada no Instagram. Nunca entendi qual é a lógica aleatória do meu cérebro pra decidir pra quem dou mole, mas, ali, já apitou um “vai fundo”. Conversei um pouco e decidi que, no fim das contas, minha vida já tava complicada o suficiente com o Mateus e, de vez em quando, o Jefferson, portanto, talvez fosse melhor só ficar na minha. Depois de alguns dias, ele voltou a puxar assunto e foi daquelas coisas loucas, sabe, quando parece que a pessoa adivinhou o dia da sua carência fodida. Quando dei por mim, conversar com ele tinha se tornado rotina e, por mais que tentasse não me empolgar, é difícil não comemorar um homem que parece ter o seu senso de humor, né?
Ele queria me comer, tava na cara, não podíamos chegar em nada perto de uma insinuação de pegação para ele já me pedir um nude em piadas cifradas. Mas eu me lembrava do meu ex, do boy do Tinder e recusava. Recusei, recusei, até que um dia acordei tão gostosa que me senti obrigada a registrar. E daí fiquei com o nude ali, na tela do celular, pedindo, não, implorando para ser apreciado, por um “tá de parabéns, hein?” que fosse. Mandei pra ele.
Com o tempo, ficou ainda mais difícil. Tentei me agarrar ao ensinamento do meu ex, mas, um dia, eu tava lá, de pijama, com o celular na mão, ele em outra cama, de cueca, assistindo jogo, com outro celular na mão. Digitando…
“O que cê tá fazendo?”
“Já tô deitada, decidi dormir cedo hoje. E você?”
“Também deitado”, enviou e logo em seguida começou a digitar uma nova mensagem. “Mas, me diz, tá vestindo O QUÊ?”
Fiquei rindo da cara de pau dele. Olhei prum lado, olhei pro outro, escolhi responder.
“Tô vestindo um shortinho rosa e uma camisa branca soltinha…”
“Hum…”
“…com letras verdes, onde se lê “Tá tranqüilo, tá vacinado”.
“Claro, sempre bom garantir que todas as vacinações estão em dia, né?”
Eu ri. Ele começou a digitar novamente, mas antes da mensagem chegar, enviei:
“E o que você queria fazer comigo?”
“Pera, cê não tava me zoando?”
“Tava, mas agora tô com vontade de ver no que isso pode dar, sabe?”
Devia ter parado ali. Odeio fazer as coisas já sabendo que pode ser um erro. E agora tenho que aguentar esse frio na barriga. Olho pro relógio e constato que ainda tenho pelo menos duas horas pra imaginar tudo que pode dar errado. Pode não ter química, ele pode ficar nervoso, pior, ele pode tremer, posso ser afoita, o beijo pode ser simplesmente ruim. E se eu não lubrificar nada? E se ele broxar? E se eu não gostar da voz, do cheiro ou do sorriso e tesão zero? E se quiser sair correndo, mas decidir ficar um pouco mais por educação, e ele ficar me lançando aquele olhar de “não sei se você quer que eu te beije, por favor me dá uma pista”? Será que vai rolar climão quando a gente se olhar?
Imagino ele me esperando na plataforma da rodoviária. Então vê meus tênis, minhas pernas e depois meu corpo todo na medida em que desço as escadas estreitas do ônibus. Caminho em sua direção com um sorriso no rosto, tentando disfarçar a vergonha. Finalmente, digo e nos abraçamos sem jeito. Ele me segura um pouco mais no abraço e chego perto de seu ouvido pra dizer num sussurro.
“Sabe, Marcelo, eu preciso mesmo fazer xixi”.
Chegou agora? Então espia esse link e dá uma conferida nos contos que vieram antes desse. Na real, dá pra ler tudo fora de ordem, de trás pra frente e até de cabeça pra baixo, mas você pode curtir saber um pouco mais sobre as coisas que a Vanessa tem que aturar.